Sem dignidade profissional o mercado publicitário não se sustenta
Reginaldo de Santana Lima
A propaganda, enquanto atividade econômica, já teve seus anos de glória. O mercado respeitava as agências pelo seu nível de criatividade, pelo talento dos seus profissionais e pela sua capacidade de gerar negócios, através da divulgação de ideias e conceitos que promovem marcas, produtos e serviços.
A partir dos anos 1990, com a informatização dos processos, o acesso aos meios de produção pelos próprios clientes, a abertura indiscriminada de faculdades de propaganda e a inserção dos profissionais a múltiplos programas de computador, a publicidade passou a ignorar a técnica em detrimento de facilidades.
Com isso, os pilares que sustentam o negócio da propaganda – cliente, agência e veículo -, também sofreram as influências, com as negociações diretas entre clientes e veículos, constituição de houses e oferta de pacotes de negócios que cortam pela metade os honorários e desconto-padrão das agências.
Neste cenário, as consequências não poderiam ser outras. A outrora boa propaganda cede espaço à especulação. O Código de Ética dos Publicitários, a lei federal 4.680/65 e as leis de autorregulamentação da atividade publicitária passam a se reunir em uma única e perversa lei: a de Gerson.
É assim que o mercado vem desenhando seu novo perfil. As boas ideias garimpadas no terreno fértil das oportunidades estão sendo substituídas pela cruel guerra de vantagens. Os critérios de criação, os métodos de elaboração de briefings e os cuidados com a produção das peças estão relegados a um segundo plano.
Isso vem acontecendo em todo o Brasil. Sem entidades de classe fortes, unidas e articuladas a ética concorrencial não se cria. A força do cliente anunciante pode mais do que a Abap, App, Abp e tantas outras, e pode mais ainda do que os sindicatos estaduais e a Federação Nacional das Agências de Propaganda.
Sem representação não há voz, não há resistência. O mercado publicitário está minado pelas regras unilaterais do anunciante. O leilão de vantagens está tornando as agências (quase) todas iguais, nivelando por baixo o talento e os salários de redatores, diretores de arte, produtores e toda a equipe técnica.
Tudo isso com o assentimento da maioria das agências. Um conformismo inexplicável que fragiliza os brios da atividade da Propaganda. Não há mais respeito pelo talento. Não se buscam mais as soluções criativas. Não se valorizam as boas ideias. Ao contrário, ferem a sensibilidade de quem respira a boa propaganda.
Mas o mercado já começa a colher o que ele próprio vem plantando. Muito além de ruins, as peças publicitárias reproduzem a mesmice em todo e qualquer veículo de comunicação. A falta de cuidado e o mau gosto imperam. A boa técnica e a inteligência não resistem a desdéns e maus tratos.
Que ninguém se engane. Não ficará impune o mercado que agride o que deveria ser seu próprio ego: a dignidade profissional.