TEM BOI NO CLIMA
Na Guerra Fria, a corrida armamentícia movia a economia mundial. A antiga URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) e os Estados Unidos disputavam a primazia de enviar o homem ao cosmos e quem seria o primeiro astronauta a pisar no solo lunar. As superpotências procuravam se “defender” construindo o maior arsenal possível de mísseis nucleares. Com a queda do Muro de Berlim, a Rússia ficou separada das outras repúblicas socialistas soviéticas e a grande questão passou a ser quem iria movimentar a nova economia mundial.
O cientista político e economista norte-americano, Francis Fukuyama, escreveu o seu famoso artigo “O Fim da História”, na revista National Interest, e três anos após, lançou o livro “O Fim da História e o Último Homem”. Passou por Platão, Nietzsche, Kant e Hegel para revigorar que naquele momento estava havendo a vitória do livre capitalismo de mercado e que a difusão mundial das democracias liberais estaria sinalizando o fim da evolução sociocultural da humanidade.
Teses e mais teses ainda hoje são discutidas para dar resposta à nossa realidade geopolítica. A ascensão da China como grande potência mundial, a invasão da Ucrânia pela Rússia, a Índia emergindo como o país mais populoso do mundo, a guerra de Israel com a Palestina/Hamas, o temor da entrada de países do Oriente Médio nesse combate, e uma polarização política tendendo para uma radicalização extrema e conflitos generalizados.
O poder mundial vitorioso daquela época decidiu que a tese do aquecimento global movimentaria a economia e, na geopolítica, as fontes renováveis de energia. Apesar de sua tecnologia ser dominada por poucos, sol e ventos estão disponíveis em todos os países na busca política da disseminação da democracia. Essas fontes de “energia limpa” deveriam substituir os combustíveis fósseis, petróleo e gás natural, energéticos produzidos em países quase sempre praticantes de regimes políticos fechados e/ou autoritários, e o carvão.
O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática), órgão ligado à ONU (Organização das Nações Unidas), passou a defender a tese que as emissões de gás carbônico (CO2) antropogênicas era a responsável pelo aquecimento global. Outro grupo de cientistas argumenta que as emissões humanas representam apenas 3% das emissões totais e que a variação da atividade do Sol, que da máxima para a mínima passa 90 anos, é quem controla o clima, com grande influência dos fluxos naturais dos oceanos, polos, vulcões e vegetação.
O CO2 é responsável por 74,4% das emissões globais, ficando os 17,6% restantes de responsabilidade do metano (CH4), que também contribui para o efeito estufa de forma diferente porque seu tempo de vida na atmosfera é curto. Enquanto o metano dura cerca de 20 anos na atmosfera, cerca de 20% do gás carbônico emitido pode ultrapassar os 100 anos. No período de 20 anos, o metano é 86 vezes mais poderoso que o gás carbônico e 34 vezes em um século. Ele também contribui significativamente na formação do ozônio ao nível do solo, responsável por um milhão de mortes prematuras por ano em todo o planeta.
No crescimento exponencial da população na Terra, o processo de desenvolvimento econômico e a migração para as cidades estimularam uma demanda sem precedentes da proteína animal, muito embora um terço dos 8 bilhões no mundo ainda passe fome. Se considerarmos uma alimentação diária de 2.000 calorias, esse 1/3 de famintos poderia ser alimentado pelo desperdício de 1/3 do topo da pirâmide de renda. Em 2022, foram emitidos 52 bilhões de toneladas de gás carbônico no mundo, enquanto o metano registrou 364 milhões de toneladas. Desde a chamada Era Pré-Industrial, o CH4 responde por cerca de 30% do aquecimento global e está avançando rapidamente.
Das emissões antropogênicas, quem mais libera metano para a atmosfera é o setor da agropecuária (40%), seguido pela energia (35%) e pelos resíduos (20%). Na agropecuária, não só pelo processo digestivo dos ruminantes, mas também pela gestão do esterco e pelo cultivo de arroz em casca. Ao se alimentarem, no estômago de bois e vacas existem micróbios que ajudam a quebrar a comida liberando hidrogênio e dióxido de carbono, quando uma enzima faz uma combinação desses gases para formar o metano.
A maior concentração atmosférica global de metano havia sido registrada em 2020, sendo que doze países, dentre eles o Brasil, são responsáveis por dois terços dela. Segundo dados do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa), em 2021, os rebanhos no Brasil foram responsáveis por 65% do metano liberado para a atmosfera no país. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e a Coalizão Clima e Ar Limpo, seria de fundamental importância para o atingimento das metas relativas às mudanças climáticas que as emissões de metano provenientes da agricultura fossem reduzidas.
As flatulências dos bois, cabras, ovelhas e outros animais, como o arroto e o pum, são emissores de metano e poderão estar sujeitos a serem taxados a partir de 2030. Encontra-se no Parlamento da Dinamarca um projeto de lei cujo objetivo é taxar as emissões de metano causadas pelo gado. Segundo dados da agência Reuters, a Dinamarca é um grande exportador de carnes e laticínios e essa atividade emissora de CH4 é também a maior de CO2 naquele país, que tem uma meta de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa em 70%, comparadas aos níveis de 1990. Fico imaginando como será fazer uma justa medição dessas emissões.
Apesar de vultosos investimentos globais em solares e eólicas, as emissões de CO2 apresentaram um recorde de 425,38 ppm em março/2024, tendo como pano de fundo não ultrapassar o limiar climático de 1,5°C até 2100. Mas, como disse o economista britânico John Maynard Keynes, “no longo prazo estaremos todos mortos”. Para quem vive na pobreza energética, o longo prazo foi ontem, razão pela qual a transição energética tem que ser justa e segura. Está na hora de serem traçadas metas decenais palpáveis, visando não só eliminar a pobreza energética, mas também alocando recursos para proteger a população dos efeitos das mudanças climáticas.
TEM BOI NO CLIMA
por Geoberto Espírito Santo
Personal Energy da GES Consultoria, Engenharia e Serviços